domingo, 27 de dezembro de 2015

PARA O ANO NOVO TAMBÉM SERVE...

Um bolinho especial, com uma calda simples e frutas maceradas em rum, um presente perfeito...

A alegria da querida Lidianne, recebendo um panetone e geleia de laranja baía feitos em casa... 


Se você quer deixar o Natal de alguém mais especial e dar a essa pessoa a certeza de ser querida e respeitada, coloque as mãos na massa e pense seriamente na possibilidade de produzir algum regalo. No meu caso, me sirvo de bolinhos, conservas, granolas para os mais naturais, geleias e doces. Mas nada impede de arrumar vidros de conserva vazios, colocar uma fita, pintar a tampa com alguma tinta bonita e enchê-lo de gostosuras para dar a seus queridos.

Latas de leite em pó vazias e enfeitadas com um belo laço também podem guardar balinhas e biscoitos. Nesse nosso mundo cada vez mais globalizado, sair das clássicas  e despersonalizadas "lembrancinhas" enche os presenteados de orgulho e atenção. Pegue aquela sua antiga receita de bolo, aquela que faz a delícia dos seus filhos e coloque em pequenas embalagens descartáveis. Na massa, se quiser, coloque porções de passas e frutas cristalizadas deixadas de molho no rum ou outra bebida que você preferir.

Polvilhe açúcar de confeiteiro quando esfriar, coloque em sacos de papel celofane, um laço de fita e prepare-se para os sorrisos de felicidade. Outra opção é preparar uma calda simples de açúcar de confeiteiro (não o impalpável) com suco de limão, que pode ser o siciliano ou o Tahiti. Coloque uma xícara de açúcar de confeiteiro numa tigela e vá acrescentando suco de limão até ficar uma calda grossa. Quanto mais suco, mais fina e transparente a cobertura ficará quando secar. Acrescente as raspinhas de limão a gosto. 

Assim que tirar os bolinhos do forno, cubra-os com a calda, espalhando bem com uma colher ou espátula por toda a superfície. Imediatamente arrume por cima frutas cristalizadas e passas deixadas de molho (e escorridas) em alguma bebida que você goste, como rum, cointreau ou whisky. Deixe esfriar, coloque em sacos de papel celofane e prepare-se para o abraço. Presentear de coração é sempre um ato de amor e as pessoas adoram.

Bom apetite!   

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Para saber mais:

Biscoitinhos de castanha: http://mesanafloresta.blogspot.com/2011/11/biscoitinhos-para-um-filho-distante.html

Cookies: http://mesanafloresta.blogspot.com.br/2014/04/tarde-boa.html

domingo, 20 de dezembro de 2015

MAIS LEMBRANÇAS DE INFÂNCIA

A galinha caipira com o jambu e pirão de castanha, deliciosa...


Se você for como eu, o Natal está na porta e o cardápio da ceia ainda muda um pouco todos os dias. Os convidados, neste ano, serão em menor número. Ou não. Alguns dos irmãos e cunhados neste ano ficarão parte em uma casa, parte em outra. Pelo menos, irão engordar um pouquinho mais se resolverem provar de tudo. Aqui em casa, não tem jeito: desde que me entendo por gente, é o único dia do ano em que como peru (à exceção dos R.O.s obrigatórios em famílias grandes como a minha, onde se cozinha sempre como se não houvesse amanhã).

E quero frutas secas e em conserva para acompanhar. E farofa também. Minha mãe, que não come nada dessas coisas, terá o seu filezinho para saborear. Não decidimos ainda o molho do acompanhamento. Ele dorme laranja e acorda bege, quase todo dia (e nisso a geladeira vai enchendo de geleia de laranja baía pedaçuda e meio amarguinha, queijo gorgonzola gordinho e à prova de dieta e castanhas do Brasil, para dar uma textura).

Meu sonho de consumo na cruzada em que me encontro (#partiu dieta!) é um pirarucu de casaca, a receita mais flex que você já viu na vida: tem quem faça com o peixe dessalgado e frito, outros apenas o aferventam. Há quem prefira a farofa seca, muitos a molham com leite de coco. Alguns incluem cubinhos de batata cozidas e um molhinho com ervilhas e azeitonas. Outros ainda colocam passas, ameixas e ovos cozidos. O céu é o limite. Em comum, o pirarucu, a banana comprida (ou da terra) frita e a farofa. O resto é lenda e livre interpretação. E no meu caso, ainda vou estudar um jeito de fazer com a banana assada, senão nem na lenda vou ficar.

Como minha alma é gorda, certamente vou incluir um pernil. Já o imagino no dia seguinte, desfiado e com muita cebola caramelizada, um pote de mostarda e um bom pão caseiro para rebater, mas aí já é delírio de quem está com fome. E escrever com fome, assim como ir no supermercado com a dita cuja, não é nunca um bom negócio. A cada ingrediente, a mente vagueia e já passeia com garbo por todas as possibilidades, sejam elas assadas ou fritas, cozidas ou não.

Para as sobremesas, já há um estoque de chocolates meio amargos de fazer inveja a qualquer bom chocólatra: pode ser um bolo, uma mousse com zabaione...a geleia de morango já está pronta na geladeira, vai que resolvemos fazer uma piada pronta, digo um pavê. Com um bom pão de ló feito em casa, castanhas torradinhas, um creme a base de gemas e frutas frescas, é um pecado. Mas, se quiser, troque por geleia de cupuaçu, biscoitos de castanha, um creminho doce e uma calda de açúcar gramixó feito aqui mesmo na região e fica delicioso do mesmo jeito.

Já encomendei para o café lindos bem-casados (biscoitinhos recheados de goiabada), biscoitos Monteiro Lopes (parcialmente cobertos com chocolate) e uma gulodice perdida nas minhas mais antigas memórias: uma balinha de açúcar com recheio de doce de cupuaçu, que descobri se chamar casinha de abelha. Por acaso, descobri uma amiga de infância, a Isabel, doceira das mais competentes, que como eu, é apaixonada pelas tais balinhas e hoje as faz por encomenda, junto com madalenas, bem-casados e biscoitos, para delírio de todos e resgate das nossas tradições.


A balinha de cupuaçu da minha infância, ou no nome de festa, casinha de abelha...doce de cupuaçu com fondant

Lembro nitidamente de esticar os braços e ficar nas pontas dos pés para alcançar essas balinhas, dispostas na mesa, em algum aniversário de família perdido no tempo, na casa de minha avó Maria ou de alguma das tias. Só as comi novamente uns quarenta anos depois, no casamento de um primo e imediatamente, tal qual no filme Ratatouille, fiz como o crítico ao degustar o prato e fechei os olhos para me ver novamente no esforço de roubar as tais balinhas . 

Mas, enquanto o Natal não chega, atualizo o blog com essa receita, para o dia a dia, feita aqui em casa para o almoço. É uma delícia, servida bem quentinha. Aproveite!   


Galinha caipira com pirão de castanha

Ingredientes

Para a galinha

01 galinha (ou frango) caipira, cortada em pedaços
Sal e pimenta do reino a gosto
Pitadas de colorau ou páprica a gosto
02 colheres de sopa de vinagre
02 maços de jambu frescos, já limpos (pode usar um pouco dos talos, se forem novos)

Para o pirão de castanha

1/2 xícara de castanha do Brasil crua (usei a parcialmente desidratada, já embalada)
1 1/2 xícara de água
1/2 xícara ou um pouco mais do caldo da galinha cozida
1/2 xícara de farinha de mandioca
sal a gosto

Modo de fazer

Para a galinha ou frango

Corte a galinha ou frango pelas juntas (eu nunca acerto, assassino a coitada duas vezes) e coloque os pedaços numa tigela, retirando o excesso de gordura. Tempere a gosto com sal e pimenta, o vinagre e o colorau ou páprica. Deixe pegar gosto por pelos menos 30 minutos. Numa panela de fundo grosso coloque os pedaços da galinha com o líquido da marinada e deixe por alguns minutos, virando de vez em quando. Vá colocando água quente aos poucos, sempre que necessário, para que ela cozinhe e tenha caldo suficiente. Prove e ajuste o sal. Se desejar, coloque na panela de pressão por uns dez a quinze minutos. Não deixe a carne ficar mole demais. Retire 1/2 xícara do caldo para o pirão e acrescente as folhas e talos de jambu. Deixe alguns minutos e desligue o fogo. Reserve.

Para o pirão 

Bata a castanha com a água no liquidificador até ficar bem homogênea.  Acrescente o caldo reservado e misture. Leve ao fogo e com cuidado despeje aos poucos a farinha, mexendo bem para não empelotar. Se desejar um pirão mais líquido, diminua um pouquinho a farinha. Deixe cozinhar.

Para servir, coloque uma porção de pirão no prato ou numa tigelinha, acrescente um pedaço da galinha conforme sua preferência e um pouco de caldo e folhas de jambu. Se desejar, complemente com arroz branco.
Bom apetite!!

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Para saber mais:

Ratatouille:  https://pt.wikipedia.org/wiki/Ratatouille_(filme)

Isabel - Encomendas de docinhos, tel (068) 99637954, Rio Branco, Acre.

domingo, 13 de dezembro de 2015

PARA LEMBRAR DA INFÂNCIA

A tortinha de banana da minha mãe, uma verdadeira delícia para comer pura ou como acompanhamento...




Sou fascinada pelo Natal. Não tanto pela carga religiosa e cristã que o acompanha, embora tenha o máximo respeito por quem se enche de boas intenções para o próximo ano e repensa profundamente sua vida e suas ações no ano que está acabando. Também não tenho o apego comercial obrigatoriamente vinculado à data, com aquela corrida insana às lojas para comprar as famigeradas lembrancinhas que quase sempre, nada tem a ver com o presenteado. Apesar das pressões, não me obrigo mais a isso há longos anos.Ou pelo menos, resisto de forma heroica e fico nas pessoas bem próximas, alguns queridos e familiares a quem é um prazer oferecer um mimo, quase sempre culinário.

Na minha família, desde criança, o Natal sempre foi um período de encantamento absoluto. Minha mãe, apesar dos quatro filhos e de trabalhar dois períodos (minha super-heroína) dava um jeitinho de produzir, com a nossa ajuda, quando cabia, alguns enfeites que já não se vêem por aí, nesse mundo de belezas industrializadas. Tudo muito, muito simples, mas carregado de uma forte emoção. Eram folhas e folhas de isopor e papéis brilhosos e coloridos, além de muitas bolas de Natal de todos os tamanhos adquiridos nas papelarias, que iriam compor diversos adornos.

Lembro bem que todos os anos ela fazia sinos e chaves para pendurar nas paredes. Eu, como mais velha, tinha o direito de usar uma faca, passada na chama do fogão, e ir recortando aqueles moldes, que seriam cobertos com papel brilhante em diversas cores e depois enfeitados com bolinhas, recortes e o que mais fosse preciso para encantar os olhos. Perdi as contas de quantas facas deixei enegrecidas e imprestáveis, com pedaços de isopor colado e já preto, muitas vezes devido à pouca habilidade para recortar a peça. Esquentava-se demais a faca, demorava-se um minuto a mais no corte e era uma vez! 

Tinha que recomeçar do zero. Mas havia dois enfeites mais trabalhosos que eu particularmente adorava: uma carruagem feita de isopor, cujas partes se encaixavam e eram depois enfeitadas para meu deleite particular e também uma vela, que mamãe fazia com um longo cano de PVC cortado e uma fieira de pequenas bolinhas coloridas penduradas em toda a sua altura. Em cima, havia uma bola maior fazendo a chama, o que a deixava perfeita aos meus olhos.Era um divertimento ajudar a prender aquele sem-número de bolinhas, alternando cores e tamanhos...

Nós, eu e os irmãos, ajudávamos (ou atrapalhávamos) em todas as etapas. Era um período muito esperado. No dia da ceia, véspera de Natal, tínhamos o direito de dormir muito tarde, pois na minha família, até hoje, só se come depois da meia-noite. E o pior é que ninguém lembrava de dar qualquer entala-gato para um bando de meninos e meninas famintos, até a bendita hora da comida. Mesa sempre cheia, cada um trazia sua especialidade. Os adultos tomavam espumantes e até nós, crianças, nos permitíamos tomar um golinho. Depois, era correr para casa e esperar a passagem do Papai Noel. Uns anos melhor, outros nem tanto, lembro da sensação de acolhimento ao despertar e ver perto da cama alguns presentes. Talvez por isso, até hoje, adore receber presente bem embrulhado, com laço e tudo!

Durante muitos anos, não arrumei árvore de Natal na minha própria casa. Estava longe da família, não conseguia comemorar muito bem. Às vezes,  passava a data no interior do Ceará, entre amigos. Aí arrumava umas árvores rústicas e fazia pacotes de balas e pequenos brinquedos para as crianças mais carentes e fazíamos lá mesmo uma ceia puxada a peru caipira, engordado para a data. Meus filhos recebiam presentinhos de manhã, ao pé da cama, mas eu já havia crescido. A comida continuou ali, mas o encantamento havia se perdido com a idade. Até que voltei a morar perto de mãe, pai e minha família, que de pequena não tem nada. Resolvi voltar a montar árvores de natal, com tudo que tinha direito.

E um dia desses, olhando as luzinhas brilhantes que piscavam aqui na sala, comecei a lembrar dos Natais de infância e em como eles me deixavam feliz. Minha mãe sempre dava um jeito de comprar presentinhos para todos e nos envolvia sempre na festa. E pensei na importância de valorizar os momentos que temos com quem amamos. Minha mãe, graças a Deus em plena atividade aos oitenta anos, continua ornamentando sua árvore, embora não faça mais os sinos e chaves da minha infância. Na semana passada, me ligou na hora do almoço, para que eu fosse comer uma torta de banana comprida frita, que é como ela sempre chamou uma espécie de malassada (que eu comia na casa de uma amiga no interior do Ceará, só que sem recheio). Lembrei que quando era pequena não gostava muito da torta, pois na correria do dia, ela era feita quase sempre em substituição ao bife frito que eu adorava e nunca gostei de misturá-la com o arroz. Minha mãe comia essa torta na sua própria casa desde mocinha e elas eram feitas em dupla, sempre. Uma delas cabia à minha mãe, que as adora até hoje. A outra, ia para o resto da família. Ela não sabe mais de onde vem a receita, mas minha avó, exímia cozinheira, orientava as auxiliares para o preparo.

Minha mãe continuou fazendo a torta para os filhos e até hoje, é uma das comidas de infância mais queridas de todos. Até mesmo eu já me rendi há tempos e de bom grado, comeria fatias e mais fatias dela. Não é necessário servir com mais nada, na hora do lanche. E ela acompanha muito bem os pratos do almoço. Mas se quiser pode juntar uma colher de geleia na hora da sobremesa e polvilhar açúcar e canela. Na nossa casa, comemos na hora do almoço junto com os outros pratos, recheada com fatias de banana comprida frita. E só. 

Hoje é para mim um dia especial: meu filho mais novo completa vinte anos, ou como diz meu marido, vinte voltas ao redor do sol. É um rapaz determinado, generoso, que resolveu que seria médico. E está no caminho do sonho, para orgulho de todos nós. Nossa árvore de Natal aqui na sala foi escolhida por ele. E apesar da distância que hoje nos separa, ele está comemorando com irmãos, pai, madrasta e avós, além de alguns amigos, com um almoço especial e merecido. E desejamos a ele toda a felicidade do mundo!

Portanto, mãos à obra: é uma fritura, mas você não vai fazer todos os dias, embora dê vontade, então, delicie-se e aos seus com essa receitinha simples e carregada de lembranças e afetos.



Torta de banana da minha mãe 

Ingredientes

Banana comprida (da terra ou pacovã) madura, frita em fatias, em óleo de boa qualidade, quanto baste (para essa quantidade, uma a duas bananas bastam)
03 ovos em temperatura ambiente
03 colheres de sopa de farinha de trigo
01 pitada de sal
Óleo para fritura, de boa qualidade

Modo de fazer

Descasque e corte as bananas ao meio. De cada metade corte fatias não muito grossas, pelo lado do comprimento. Polvilhe uma pitada de sal e frite-as em óleo abundante, poucas por vez, até acabar. Escorra o excesso de óleo, de preferência arrumando-as em peneira de metal ou folhas de papel absorvente. Reserve. Bata as claras até ficarem firmes, acrescente as gemas e bata mais um pouco, até ficarem bem firmes. Com muito cuidado, peneire uma colher de sopa de farinha de cada vez, misturando delicadamente de baixo para cima. Acrescente a pitada de sal com cuidado e misture. Numa frigideira não muito larga, de fundo grosso, coloque óleo suficiente para cobrir todo o fundo. Quando esquentar bem, coloque rapidamente metade da massa e espalhe. Arrume as fatias de banana a gosto, até cobrirem a massa. Não precisa colocar demais. Cubra imediatamente com o restante da massa, alisando para que não fiquem partes descobertas. Quando dourar embaixo, deslize a torta delicadamente para um prato grande.Retire o excesso de óleo da frigideira, para não se queimar e com a ajuda do prato, vire a torta na frigideira de modo a que a parte crua fique para baixo. Pelas beiradas, coloque um pouco de óleo e volte a frigideira ao fogo. Essa operação precisa ser bem rápida para que a torta não grude. Quando ficar dourada, deslize-a para o prato de servir, enxugue o excesso de óleo com papel absorvente e sirva. É uma delícia!!


sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

SOBRE O AMOR E OS ENCONTROS

Eu, Elício  (fazendo a dedicatória de seu livro) e Olívia, cafezinho com literatura boa...



Ainda bem que só tem um jornalista aqui em casa. E daqueles à moda antiga, que consegue sentar e produzir um texto belo e tocante de olho no prazo para a conclusão. E que trabalha com o fato de que após a escrita ainda há um mundo de pequenas e grandes providências até que esse texto seja enfim apreciado pelos nobres leitores.

A edição, a diagramação correta, a escolha da foto se for o caso...escrever de forma profissional, penso eu, preserva a paixão mas exige disciplina, concisão, método...tudo que eu infelizmente não tenho. Sento para escrever as matérias aqui do blog quando uma vozinha interior praticamente me empurra. E se não for para fazer o texto de uma vez e de supetão, feito lava despencando vulcão abaixo, sinto muito: não sou eu.

Não sei fazer essa coisa bonita de burilar as palavras, mergulhar nelas e ir meio que desvendando os mistérios ali sutilmente escondidos, apara aqui, corta acolá, acrescenta ali um recheio de bolo com mais creme, ops, uma palavra mais doce. Minha emoção sai de uma vez, minhas saudades são as da hora, meu tempo é o hoje.

E depois que tive meus pequenos grandes meninos e que os danadinhos resolveram se lançar em vôo solo, como aliás fiz muito antes deles, no meu tempo, aí nem sempre as emoções me obedecem. Tem dias que a saudade aperta e a dor é quase física. Tem dias que tenho saudade até do que não vivi e começo a lembrar dos antigamentes e começo a pensar na época dos meus pais e dos bailes que eles frequentavam e o que eles comiam e os doces que meu avô português trazia para as filhas numa latinha, feitos por um senhor árabe que morava por perto...

E tenho saudade dos bolos que minha avó Mundiquinha confeitava e que não pude provar pois quando eu tinha idade de aprender ela já não os fazia mais. E penso na minha avó Maria e suas lindas galinhas assadas para os bingos, envoltas em farofa e embrulhadas em papel celofane, com umas azeitonas enfeitando o prato...não sou saudosista, antes que alguém mais desavisado e gentil me leve lencinhos bordados com renda, brancos e engomados, para que eu enxugue discretamente uma lágrima perdida.

Mas gosto de pensar no que passou e em como passou. Para mim, isso me dá a medida do presente e lança a orientação para o futuro. E tive dias atrás o prazer de conhecer de verdade dois queridos que já conhecia virtualmente. E neste caso, conseguimos deixar a tecnologia das redes sociais onde a meu ver, ela deve estar. Ajudando a estabelecer conexões, proporcionando encontros, não os substituindo.

Não poderia ser diferente, quando se trata de Elício e Olívia. Dois escritores, cada um a seu modo e estilo, unidos pelo amor e outros prazeres, entre os quais a literatura. Eu e Olívia já nos conhecíamos pela internet, onde seus comentários sobre as matérias do blog sempre me encheram de orgulho. Li seus livros, deliciosas crônicas sem outra pretensão que não a de ser verdadeira com seu tempo, com seu mundo, seus ideais. Uma mulher de carne e osso, sensível e apaixonada pela vida.

Elício, seu companheiro de alguns anos, o amor do tempo maduro, é de uma delicadeza ímpar. Não pudemos conversar muito, os poucos dias aqui passados foram bem disputados por parentes e amigos. Ganhamos um de seus livros de poemas, leitura leve e amorosa. Que prazer encontrar quem como eu, morre de ciúme dos seus livros (ainda que a vergonha de ter ciúme seja ainda maior), garimpados ao longo da vida.

Nos prometemos um café mais longo, no próximo encontro. Regado a mais gente, velha guarda prazerosa e que ainda gosta de ler um bom livro. E que ainda consegue conversar sem o olho grudado na próxima atualização do whatsapp. Simples assim. Momentos de acolhimento em que parecia até que nos conhecíamos há muito tempo. Daqueles que nem dá vontade que acabe. E que venham os próximos!

Para eles, dou aqui uma receita muito simples, mas que me acompanha desde que eu era garota e orgulhosamente alguém da família pedia meu chocolate quente. Não o faço mais com aquela marca famosa de achocolatado, que no meu tempo de menina e de lembranças, não era tão açucarado. É comida de alma, como diz a escritora e cronista Nina Horta. Serve para aqueles momentos de aconchego numa tarde chuvosa. Ou quando se quer dizer a alguém que a vida vale muito, muito a pena de ser vivida. Faça e me diga!



Delicioso, com um pauzinho de canela servindo de colher...


Meu chocolate quente fácil  

500 ml de leite integral
01 pauzinho de canela
02 gemas passadas na peneira e dissolvidas com um pouquinho de leite
01 colher de sopa de amido de milho dissolvido em um pouquinho de leite (opcional)
04 a 06 colheres de sopa de chocolate em pó (a gosto, aqui pode ser colocado um pouco mais ou menos. Se usar cacau em pó, diminua a quantidade)

Para a cobertura

02 claras em temperatura ambiente
04 a 05 colheres de sopa de açúcar e gotas de limão a gosto (eu gosto hoje em dia de usar o siciliano, mas qualquer limão serve)
raspas de limão a gosto (não colocar a parte branca)
canela ou chocolate em pó para polvilhar (opcional)

Modo de fazer

Numa panela de fundo grosso, coloque o leite e a canela em pau. Leve ao fogo, acrescentando as gemas dissolvidas no leite e mexendo bem após a adição, para que não talhem na mistura. É importante colocá-las com o leite ainda frio, se não tiver experiência. Mexa sempre, até ferver e cozinhar. Acrescente o chocolate em pó e mexa bem. Se preferir, coloque o amido dissolvido no leite, mexendo bem para que não empelote (mas as gemas já garantem cremosidade). Após ferver bem, retire do fogo e coloque nas xícaras em que vai servir, retirando antes a canela em pau. Coloque rapidamente as claras em uma tigela e bata até espumar bastante. Vá acrescentando aos poucos as colheres de açúcar, até que fique um merengue bem firme. Pingue as gotas de limão e acrescente as raspas. Despeje uma grossa camada desse merengue em cada xícara com o chocolate quente e polvilhe canela ou chocolate em pó. Sirva.

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Os livros da Olívia...




E o do Elício...




Todos os livros são edições dos autores, que bancam a própria impressão. O projeto gráfico é de Tancredo Maia Filho. Você pode encontrar as edições na Livraria Paim, em Rio Branco. Imperdíveis!!

Livraria Paim - www.livrariapaim.com.br

     

domingo, 1 de novembro de 2015

PARA DONA NEUZA, COM SABOR E CARINHO



Dona Neuza e Marcos Afonso cantando "Marina"


Ando um bocadinho preguiçosa para postar aqui as receitinhas que vão se intrometendo devagar, ansiosas por um lugar ao sol. Esse não tem sido um ano muito fácil e embora haja muito a celebrar, aqui e ali tenho precisado de uma dose extra de ânimo e coragem, para enfrentar um ou outro problema e algumas perdas, entre as quais a de minha sogra, que se foi tão rápido que mal deu tempo de nos acostumarmos com a ideia.

Ela foi uma querida pessoa que me recebeu em sua família de uma maneira carinhosa e muito atenciosa. Me chamava às vezes de anjo mas era eu quem me sentia bem acolhida e protegida quando estava com ela. Em todos os almoços e comemorações de família, sempre havia para mim uma jarra de suco fresquinho, pois ela, apesar de adorar refrigerante, sabia que há muitos anos eu não mais o tomo.

Meu divertimento era ouvir a conversa dela e do filho mais velho, meu marido Marcos Afonso: ele puxava o mote, como se diz no Nordeste, sobre uma ou outra situação ou mesmo um parente distante...e aí ela atualizava o assunto ou a situação do parente, de maneira muito séria e ao mesmo tempo tão divertida, que eu ficava ali viajando naquela varanda cheia de plantas, na cadeira de balanço confortável, muitas vezes mergulhando naquelas memórias de tempos e pessoas que já se foram há muito e que aquelas conversas resgatavam...

Como é normal de acontecer, os outros irmãos faziam muita troça a cada vez que o mais velho ia visitá-la, o que nem era tão frequente. Diziam que a comida ficava especial e o melhor prato era sempre o dele. Que ela nem dormia, para ficar tudo a contento e que ultimamente, quando não mais cozinhava, só faltava deixar sua auxiliar sem juízo para que tudo saísse perfeito. E meu marido, é claro, fazia de conta que nem era com ele, mas por dentro explodia de orgulho com a atenção.

Com ela aprendi a fazer a casquinha de siri, deliciosa. E também uma vez me deu uma aula de charutos (prato muito popular entre nós), para serem feitos do jeito que o filho gostava. Sua sopa era maravilhosa, com feijão batido, carne cozida bem molinha, muita couve e temperos. Mas o seu prato de resistência era mesmo o famoso frango no tucupi. Nos dias de festa e de chegada da filha mais velha que há muitos anos mora fora do Estado, era o prato que nunca nos cansávamos de comer, sempre arrumado em grandes travessas. A sobremesa, quase sempre um belo pudim de leite ou um creme de cupuaçu, era bem disputada.

Numa noite, recebemos um convite para comer mungunzá (mingau de milho branco). Delicioso, chegamos com a mesa já arrumada e uma linda panela repleta do delicioso mingau. Mas o mais engraçado foi ouvir dos meus cunhados Neuma e Riva a verdadeira epopéia para a confecção do prato: prova daqui, prova dali, após inúmeros testes não havia dado certo irmos no dia combinado. E ela, é claro, mandou fazer tudo de novo, com a supervisão atenta, para que o filho mais velho pudesse degustar tudo fresquinho. 

Eu dizia que tinha que aprender com ela, pois na nossa casa, muitas vezes os convidados chegam na hora da finalização dos pratos, quando não participam do preparo ou acompanham de perto os movimentos finais. Estou sempre afobada, correndo, talvez fruto de um planejamento distante anos-luz do dela. Mas, em sua casa, nunca chegamos sem que a comida estivesse distribuindo cheiros tentadores, fumegante nas panelas ou já arrumada na mesa e a sobremesa, quase sempre um doce gelado, apenas aguardasse o momento de ser servida.

Não postarei hoje nenhum prato da dona Neuza, mas prometo que resgatarei com as cunhadas o belo frango no tucupi, para futuramente apresentá-lo por aqui, depois de testar minha competência para fazê-lo. E desejo a ela, onde estiver, muita paz. Nós que ficamos, entregamos a ela todo o nosso afeto e saudade.

Essas berinjelinhas em conserva não tem uma receita fixa. Dependem um pouco da sensibilidade do paladar de quem vai prepará-las. As indicações são gerais e as quantidades podem ser adaptadas. O resultado final é muito saboroso e a conserva pode ser servida como acompanhamento, dentro do pão, na bruschetta, enfim, use a sua imaginação. Se sobrar, coloque em um belo vidro com mais azeite e dê para aquele amigo ou amiga queridos, eles vão adorar!





Conserva simples de berinjelinhas    

Ingredientes

Berinjelinhas a gosto (na falta, use berinjelas de tamanho normal, cortadas em quartos ou metades)
Sal a gosto
Azeite a gosto
Vinagre de maçã, a gosto
Alho picadinho a gosto 
Castanhas do Brasil picadas
Mel a gosto 
Passas (opcional)
Pimenta rosa (opcional)

Modo de fazer

Lave todas as berinjelinhas, mantendo o cabinho. Faça um corte ao comprido, sem separar as metades. Polvilhe bastante sal entre as metades e deixe-as todas em peneira para escorrer, uns 15 a 20 minutos. Após esse tempo, lave-as para retirar o excesso de sal e enxugue-as. Numa assadeira grande, que as caiba sem empilhar (se necessário, use mais de uma), coloque um pouco de azeite. Arrume as berinjelinhas, abra ligeiramente as metades, coloque um pouquinho do alho em cada uma e quando acabar, regue-as com bastante azeite. Respingue-as com vinagre de maçã, de maneira que cada uma receba um pouco. Cubra as assadeiras com papel alumínio, tendo o cuidado de deixar uma abertura. Elas não devem cozinhar e sim assar bem lentamente. Leve a assadeira (ou mais de uma, se usar) ao forno baixo e de tempos em tempos, dê uma olhada e uma mexida nas berinjelas para que assem por igual. Se necessário, acrescente um pouco mais de azeite e um tico de água, só para não grudarem na assadeira. Também coloque um pouquinho mais de vinagre. Quando estiverem quase prontas, coloque por cima e entre as metades as castanhas bem picadas. Se desejar, acrescente passas a gosto e pimenta rosa. Cubra novamente e deixe até que fiquem bem macias, porém firmes. A assadeira deve estar com alguns pedacinhos meio caramelizados. Retire as berinjelinhas para a vasilha, tigela ou pote em que vai acondicionar. Prove e verifique a acidez, para colocar um pouco de mel, mais sal se precisar, um tico de vinagre e mais azeite. Aqui, o que vale é seu paladar.
Elas estão prontas para serem servidas ou podem descansar na geladeira até serem servidas. É desejável deixá-las com um molhinho, para que não ressequem (a mistura de mel, azeite e vinagre). Deliciosas! 

Esse post é dedicado à memória de dona Neuza, minha querida sogra.

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Para saber mais:

Miragina: veja em www.miragina.com.br

Cooperacre: veja em www.cooperacre.com

Acremel - Cooperativa dos Criadores de Abelhas do Estado do Acre

domingo, 6 de setembro de 2015

E PORQUE ONTEM FOI SÁBADO

O bolo pronto, com a calda fria de limão siciliano...

Com geleia de abricot e cognac da marca Queensberry...

Com geleia caseira de morango...


O que fazem as lindas músicas com a nossa memória? Atravessam fronteiras e espaços, voam céleres por cada pequeno labirinto, até os mais escondidos e distantes e resgatam momentos esquecidos, lembranças cheias de luz e vigor...e digo isso porque a cada vez que me pego pensando nos sábados de cada semana, imediatamente me vem na cabeça uma canção, que há muitos anos não ouvia.

Nem mesmo sabia que ela tinha sido gravada. Eu a conheci através de um de seus compositores, responsável pela letra, há quase trinta anos atrás. Ainda grávida do meu primeiro filho, morava no Ceará, para onde tinha me mudado recentemente. Não lembro de muitos detalhes, mas do sorriso alegre dele e de sempre cantarolar essa música, que aprendi a gostar imensamente, por ser divertida e contrapor valores de uma forma bem lúdica.   

E ontem, quando resolvi aproveitar uns limões sicilianos dando sopa aqui por casa, lembrei da música...porque era sábado! E resolvi arriscar uma procura na santa internet, que me mostrou algumas gravações e numa delas está nosso amigo, que talvez, trinta anos depois, nem lembre mais de mim. Mas a sua voz forte e a irreverência filosófica sobre os sábados e os bêbados...estão lá!

Então, para Marcus Dias (autor da letra) e Isaac Cândido (autor da música), esse bolo de limão vai ajudar a recuperar o sábado, mas com um toque cítrico bem pronunciado. Se quiser, acompanhe com uma colherada de geleia de morango caseira ou um dos lançamentos recentes da marca Queensberry, a geleia de abricot com cognac, ou outra de sua preferência. Com uma bela xícara de chá ou um espresso, deixarão o seu domingo perfeito!
  

Bolo simples de limão siciliano

Ingredientes

Para o bolo

175 g de manteiga sem sal, em temperatura ambiente
02 xícaras de açúcar refinado
01 pitada de sal
03 ovos inteiros, em temperatura ambiente
03 xícaras de farinha de trigo (usei farinha italiana, que é bem mais leve do que a nossa. na falta, substitua 1/2 xícara da farinha por amido de milho), peneiradas após medidas
01 pote de iogurte natural integral despejado em uma xícara de chá e completado com leite até a borda
1/4 de xícara de chá de leite 
1/4 de xícara de chá de suco de limão siciliano
Raspas de limão siciliano a gosto (cuidado na hora de fazer as raspas, para que não venha junto a parte branca)
01 colher de sopa de fermento químico para bolo

Para a cobertura

Suco de 01 limão siciliano
Açúcar de confeiteiro a gosto, até formar uma calda grossa (prove para verificar o sabor e seu gosto pessoal, acrescentando mais ou menos açúcar)

Modo de fazer

Para o bolo

Unte e enfarinhe uma forma de buraco no meio. Acenda o forno na temperatura de 180 graus. Numa tigela ou batedeira, coloque a manteiga e o açúcar e bata até virar um creme. Coloque a pitada de sal. Acrescente os ovos, um de cada vez, batendo bem após cada adição. Numa tigelinha, coloque a mistura de iogurte e leite, o restante do leite puro e o suco de limão. Misture e vá colocando na massa, alternando rapidamente com a farinha (ou a mistura de farinha com amido de milho). Isso não deve demorar, para que a massa não fique dura. Acrescente as raspas de limão e o fermento e misture rapidamente. Coloque imediatamente na forma, dê algumas batidas para tirar o ar e leve ao forno. Após vinte e cinco a trinta minutos, vire a forma para que asse por igual. Após assado, retire do forno e aguarde esfriar um pouco. Desenforme e aplique a cobertura. Sirva puro, com chá, café ou chocolate ou acrescente uma geleia de sua preferência.

Para a cobertura

Numa tigelinha, misture o suco de limão com o açúcar de confeiteiro a gosto, até virar uma calda grossa. Assim que desenformar o bolo, despeje a cobertura com uma colher, decorando a gosto. Pode se quiser, enfeitar com frutas secas ou nozes/castanhas.


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Para conhecer o ótimo trabalho do Isaac Cândido e Marcus Dias e ouvir uma das minhas preferidas músicas, acesse:


https://www.youtube.com/watch?v=RMf9uvcAHwg

https://www.youtube.com/watch?v=ZjzRBPQoOGU

https://www.youtube.com/watch?v=m4y3wnXDl5A

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

APRENDIZADO E EMOÇÃO



Chef Enzo De Pra no mercado Elias Mansour, conhecendo as ervas locais. Aqui, com o jambu
Foto: Diego Gurgel



No mesmo mercado, observando o peixe seco
Foto: Diego Gurgel

Conhecendo o mastruz, junto com o empresário Gianmaria 
Foto: Diego Gurgel

Com a chicória, planta muito utilizada por aqui...
Foto: Diego Gurgel

O chef Enzo De Pra no mercado Elias Mansour, limpando ele mesmo o maxixe...
Foto: Diego Gurgel


Escrevo aqui na sala em meio a um calor amazônico que nem a chegada da noite conseguiu aliviar. O cheiro de fumaça dessa época tão peculiar na região, em que as chuvas escasseiam e os irresponsáveis continuam a nos brindar com a queima das folhas de seus quintais, ocupa todo o espaço das minhas narinas. A "quentura", como falamos por aqui , me obriga a tomar tanta água que já sinto não só o estômago, mas o corpo todo dilatado. Que venham logo as chuvas!

Tive a honra e a oportunidade de há uns dias atrás, acompanhar o grande chef italiano Enzo De Pra e o produtor de eventos e empresário Gianmaria Radice em uma visita técnica ao nosso Estado, para conhecer a gastronomia amazônica e reunir subsídios para a elaboração de um jantar italiano com produtos brasileiros, especialmente o peixe, no próximo mês, na Expo Milão.
Mas a visita, que contou com o apoio do Sebrae, restaurante La Nonna, Cooperacre, Supermercado Araújo e Peixes da Amazônia e rendeu várias atividades, teve um de seus grandes momentos em um jantar beneficente promovido pelo Acre Solidário, que tem dado um verdadeiro show na promoção de eventos com fundo social.

Em quase dez dias, tivemos bate-papo com estudantes, cozinheiros e donos de restaurante, oficina para chefs e cozinheiros locais, degustação e troca de informações e experiências, visitas a produtores, mercados, e muita, muita emoção. O chef Enzo De Pra, um simpaticíssimo senhor de setenta e poucos anos, tem uma vivacidade que impressiona. Mesmo com uma agenda lotada e desconfiando seriamente de que em meu passado eu tenha algum parente alemão, pelo cumprimento quase cartesiano das atividades previstas, ele e seu colega empresário, que também fez às vezes de tradutor, encantaram-se com os produtos da região e com a acolhida recebida.

Na primeira visita realizada, à fábrica peixes da Amazônia, o chef mostrou outra de suas mais expressivas características, a curiosidade: não se conteve e de faca em punho, filetou ele mesmo um dos peixes ali preparados, com o maior bom-humor. No bate-papo, realizado na Biblioteca da Floresta, relembrou sua ida à Suíça, para estudar gastronomia. Ao voltar, sua mãe, fonte de inspiração e grande cozinheira, escutou pacientemente o filho ensinar-lhe a fazer o nosso pão de ló (o pan di Spagna), sem demonstrar em nenhum momento já dominar a técnica, fato lembrado pelo chef com emoção. Com a maior humildade, relembrou aos chefs, cozinheiros e estudantes presentes o que não pode faltar na cozinha, a paixão.

Sorridente, tranquilo, falou de tudo um pouco e nos deu uma aula de sabedoria. Sucesso absoluto! Em uma das atividades, no mercado, ficou feliz de provar o suco de cupuaçu sem açúcar. Comprei de presente para ele um xarope de guaraná e o fiz provar uma colherada, que rendeu gargalhadas e brincadeiras até o fim da visita, pois engasgou-se e supostamente creditou toda a sua energia a partir de então à tal colher de xarope.

Poderia falar muito aqui de todo o aprendizado e da experiência. Mas atenho-me a duas coisas que me chamaram particularmente a atenção: no jantar, realizado no ótimo espaço do restaurante La Nonna e que contou com toda a atenção e gentileza de suas proprietárias, Maria e Sibelle Khallil, fez questão absoluta de chamar a equipe que o ajudou e dividir as palmas, humildemente. E no dia seguinte, voltou ao restaurante, para ensinar pacientemente toda a equipe a preparar o tiramisu, do zabaione ao pão de ló.

Para o risoto, o primeiro prato do jantar servido à moda italiana, fez questão de trazer o arroz da Itália. O tartar de pirarucu, fresquíssimo, contou com o seu ótimo aceto balsâmico, envelhecido há quase vinte anos, produzido por ele, artesanalmente, em seu restaurante Dolada, que conta com uma estrela Michelin desde o início dos anos setenta. Os cabelos brancos escondem uma alma jovem, recheada de pérolas, como a que ouvimos aguardando os últimos minutos para o pão de ló ficar pronto: mais ou menos algo como "...tudo na vida é ter experiência, mas quando a adquirimos por completo, está na hora de morrer..."

Antes de viajarem de volta, o chef Enzo e Gianmaria Radice, que o acompanhou, fizeram questão de conhecer o seringal Cachoeira, em Xapuri. Lá, comeram galinha caipira e tambaqui, purê de macaxeira, banana frita e creme de araçá e graviola. Mas, principalmente, visitaram a Rainha da Floresta, uma samaúma gigante e cheia de energia, que encanta quem a vê. E o chef, do alto de sua experiência, mereceu elogios do guia seringueiro que nos acompanhou, primo de Chico Mendes, ao cortar corretamente a seringueira para extrair o látex. Para nossa surpresa, a bolinha feita com ele voltou para a Itália, como souvenir de uma viagem que nos rendeu muitas histórias. Arrivederci!


Pan Di Spagna do chef Enzo De Pra (o nosso pão de ló)

Ingredientes

16 ovos (se forem muito pequenos, acrescentar mais 1)
500 g de açúcar cristal
250 g de farinha de trigo italiana para bolos
250 g de amido de milho
01 pitada de sal
raspas de limão (mais ou menos 01 colher de chá)

(obs.: Adaptei as quantidades, dividindo a receita original por quatro, conforme abaixo. Não tinha farinha italiana em casa, então usei a de tipo 1, que é a que se encontra no Brasil. Nesse caso, usei 100 g da farinha e 25 g de amido, combinação que me pareceu mais saborosa. Fiz duas vezes e na primeira, usei metade de farinha e metade de amido e açúcar cristal. Ficou um sabor que não se parecia com o ótimo pão de ló do chef, daí a adaptação).


Receita do chef adaptada e reduzida

04 ovos inteiros em temperatura ambiente
125 g de açúcar cristal
100 g de farinha de trigo tipo 1
25 g de amido de milho
01 pitadinha de sal
1/4 de colher de chá de raspas de limão
Papel manteiga para desenformar

Modo de fazer
(Aqui também precisei adaptar, pois minha cozinha é doméstica)

Coloque uma panela com água para ferver que possa receber a tigela da batedeira, sem encostar na água. Preaqueça o forno a 160 graus. Unte e enfarinhe muito bem uma assadeira média. Na tigela ou similar, coloque os ovos, o açúcar e as raspas de limão. Reserve. Em outra tigela, coloque a farinha, e o amido e a pitada de sal. Reserve. Com um fouet (de preferência, mas se não tiver use um garfo), bata ligeiramente a mistura de ovos, açúcar e raspas. Encaixe essa tigela na outra com água fervente, tomando cuidado para que ela não encoste na água e bata sem parar por alguns minutos, de forma leve, com cuidado para não deixar os ovos cozinharem, apenas para amornar levemente. retire a tigela do fogo e leve imediatamente à batedeira. Bata devagar por um minuto e depois aumente a velocidade, batendo bem por dez a quinze minutos, até o ponto de fita. Os ovos terão crescido bastante e formarão um creme bem aerado e claro. Com muito cuidado, acrescente a mistura dos secos, peneirando um pouco de cada vez e misturando de baixo para cima, devagar. Se não tiver o fouet , use um garfo. Espalhe essa mistura na assadeira preparada e leve ao forno baixo até dourar. No meu forno levou quase 18 minutos, mas é preciso olhar. Em forno profissional a 160 graus 10 minutos deverão ser suficientes. Retire a assadeira do forno. estenda uma folha de papel manteiga, polvilhe-a com açúcar cristal e desenforme de uma vez, dando uma batida para que a massa se solte. A partir daí, você pode cortar discos e montar tiramisus ou outros doces. Se quiser, corte em retângulos compridos e leve-os de novo ao forno, polvilhados com açúcar ou pó de castanha, para ter deliciosos biscoitos para o café, chá ou chocolate! Bom apetite!  

Meus agradecimentos especiais ao fotógrafo Diego Gurgel, autor dessas lindas fotos!

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Para saber mais:

Ristorante Dolada - http://www.dolada.it/

Sebrae - www.sebrae.com.br

Peixes da Amazônia - www.peixesamazonia.com.br

Restaurante La Nonna - Parque da Maternidade, Via Parque, Rio Branco, Acre

Cooperacre - www.cooperacre.com

Supermercado Araújo - www.araujosuper.com.br










domingo, 24 de maio de 2015

PURA EMOÇÃO

Bicho de pé com os granulados coloridos da Callebaut...



Fui criada em família grande, de muitos primos, praticamente irmãos. Nossas mães são até hoje muito unidas e nos ensinaram a estar sempre juntos, seja na doença, seja na festa. Às vezes passamos tempos sem nos ver uns aos outros, alguns moram em outros estados, mas em momentos de necessidade estamos sempre, sempre grudados. E hoje em dia, já com nossos filhos, enteados, netos, cunhados, maridos e mulheres, a família cresceu tanto que fica difícil reuni-los numa única comemoração.

Falo aqui da família de minha mãe, sem contar os inúmeros primos e tios por parte de pai e a imensidão da família de meu marido, esta sim, tão grande que eles nem se tratam pelo nome, pela dificuldade de lembrá-los todos: é primo pra cá e primo pra lá e assim vai. Minha mãe é a segunda em seis filhas. Uma delas partiu ainda bebezinha e outra veio para a família já grandinha. Mamãe formou-se em Farmácia na cidade de Fortaleza e foi uma das primeiras, se não a primeira farmacêutica aqui do Estado a exercer essa profissão, razão pela qual foi homenageada em Brasília há uns dois ou três anos atrás, juntamente com outros colegas pioneiros Brasil afora.

É uma senhora simpática e mais ativa do que a idade poderia supor. Dirige para todo lado e tem dificuldade para ficar sentada em um canto, simplesmente descansando. Digo para ela que eu mesma não tenho energia suficiente para acompanhá-la e muitas vezes penso que esse material do qual antigamente as pessoas eram moldadas deixou de ser fabricado. Uma pena, pois bem que eu queria ter essa força o tempo inteiro.


Minha tia Myosote e minha mãe (de azul). Ainda faltam as tias Branquinha, Néca e Vera, que residem fora do Estado

Concentrada, apagando a velinha...

Irmãos e alguns dos muitos e queridos primos...

Eu e mamãe, no selfie...


A danadinha trabalhava dois períodos, exercia a profissão junto à algumas drogarias, engoma muito bem até hoje (coisa que eu nunca aprendi) e sempre deu conta de nos levar ao clube, ao médico e ao dentista e estar conosco em todos os momentos necessários de nossas vidas. Meu pai, apesar de ajudar, nunca foi muito fã de nos levar ao cinema ou à piscina, como ela sempre fez. Dentro do seu fusquinha amarelo, até hoje me pergunto como ela conseguia colocar nove filhos e sobrinhos de idades variadas, alguns já grandes inclusive. Diz uma prima que ela o fazia em camadas, mais velhos por baixo, menores em cima.

Quando resolvi ir embora para outro Estado, ela me deu a maior força, embora morresse de saudade e chorasse sempre. Aprendi com ela a dar asas a meus filhos quando quiseram voar por conta própria. Meus pais são para mim exemplo de força, amor e superação e mesmo quando meu pai teve um problema de saúde que limitou sua capacidade física, não se deixaram abater. Mamãe e ele vão ao shopping, à casa dos filhos e só não dão vôos maiores porque estamos de olho, ali pertinho.

Por isso, quando resolvemos comemorar o aniversário dela de nada mais, nada menos que oitenta primaveras, era preciso caprichar, se não na sofisticação da festa, que foi simples, no carinho e nos detalhes para que ela pudesse aproveitar seu dia de princesa. Não sem briga. Ela não queria de jeito nenhum, pois "ficaria contrariada de nos ver gastando dinheiro para isso". Foi preciso negociação e paciência para que ela enfim aceitasse um café da manhã aqui em casa.

Fechamos o cerco e dissemos a ela que faríamos a festa com ou sem a sua presença. Foi a deixa para ela começar a curtir, fazer alguns convites e enfeitar-se. Compramos roupa nova, foi para o salão e até mesmo combinou a cor das unhas com o vestido, sugestão aceita de uma das cunhadas. No dia do café, chuva desde cedo. Ela me ligou muito aperreada:" Minha filha, será que não vai molhar tudo?".Havia até mesmo esquecido da garagem aqui de casa, onde seria a festa, obviamente coberta. Foi uma emoção só.

Não resisti ao choro quando vi entrar em nossa casa vizinhos que me viram quase bebê e que fizeram parte do meu dia a dia, por anos a fio. Senti-me privilegiada por ver tantos primos queridos, sobrinhos e amigos, dividindo conosco esse momento tão especial para meus irmãos e meu pai. Foi um tal de tentar falar e cair no choro, foi minha tia lembrando alvoradas passadas, tudo o que uma boa festa de família sempre tem. Sem nenhuma confusão.

Então, querida mãezinha, que venham outros oitenta e que você continue conosco por muitas e muitas primaveras, nos ensinando e apoiando sempre. Para você, todo o nosso amor. Nossos agradecimentos especiais ao Chalé do Trigo, que providenciou as guloseimas e à Jeane, responsável pelo bolo. Por não resistir, ainda fiz bolo de cenoura e banana, além de ter entrado na madrugada junto com minha cunhada e sobrinhos para enrolar doces que ela, mesmo sem poder comer, adora. Deixo aqui algumas dessa receitinhas, bom proveito!


O lindo bolo, que ela amou!

A mandala de docinhos: beijinhos, brigadeiros com cookies, bichos de pé e casadinhos...

Bichos de pé de framboesa e os beijinhos...


As mãos de muitas histórias, ajudando a enrolar doces... 


Bolo de cenoura
(essa receita é mais simples do que a outra que faço, adaptada do livro Celeiro, de Rosa Lacombe. Veja em http://mesanafloresta.blogspot.com.br/2012/04/gracias-aos-amigos.html)

Ingredientes

01 xícara de chá de óleo de milho ou similar
03 ovos inteiros
03 cenouras médias, descascadas e cortadas em rodelas
02 xícaras de chá de açúcar
02 xícaras de chá de farinha de trigo
1/2 xícara de chá de passas brancas
1/4 de xícara de nozes ou castanhas picadas
02 colheres de sopa de fermento para bolo
01 pitada de sal
01 barra de chocolate meio amargo para a cobertura ou ao leite, se preferir 

Modo de fazer

Unte e enfarinhe uma assadeira média ou uma forma de buraco no meio. Preaqueça o forno em 180 graus. Separe os ingredientes e no liquidificador, despeje o óleo e os ovos. Comece a bater e vá acrescentando os pedaços de cenoura aos poucos, até virar um creme, bem batido. Despeje esse creme em uma tigela e coloque o açúcar, misturando bem. Acrescente a farinha e as passas e castanhas, se usar. Misture apenas até homogeneizar. Coloque o fermento e o sal e apenas misture rapidamente. Despeje essa massa na forma preparada e leve ao forno até assar. Retire após assado, aguarde alguns minutos e desenforme ainda quente, com cuidado para não quebrar. Espalhe por cima o chocolate picado, em toda a superfície do bolo. O calor vai fazer com que ele derreta. Passe uma espátula ou faca, espalhando o chocolate por todo o bolo. Aguarde esfriar completamente para servir.

Beijinho

Ingredientes

01 lata de leite condensado
02 gemas passadas na peneira
02 colheres de sopa de manteiga sem sal
100 g de coco seco ralado sem açúcar (pode ser usado o coco fresco)
01 pitada minúscula de sal
Cravos da Índia quanto baste

Modo de fazer

Misture todos os ingredientes em uma panela de fundo grosso. Passe manteiga sem sal em um prato ou forma. Leve ao fogo bem baixo até que solte do fundo da panela, mexendo sem parar, de forma contínua, de preferência com uma espátula de silicone ou um fouet. Aguarde esfriar e enrole os docinhos no tamanho de sua preferência, passando-os em açúcar refinado. Coloque-os nas forminhas e espete um cravo da Índia em cada um. Guarde-os em embalagem tampada até a hora de montar a mesa, para que não ressequem.

Bicho de Pé

Ingredientes

01 lata de leite condensado
01 colher de sopa de manteiga sem sal
01 embalagem pequena de pó para gelatina sabor morango ou framboesa
Açúcar de confeiteiro (não impalpável) ou confeitos coloridos para enfeitar 
01 pitada minúscula de sal

Modo de fazer

Misture todos os ingredientes em uma panela de fundo grosso. Passe manteiga sem sal em um prato ou forma. Leve ao fogo bem baixo até que solte do fundo da panela, mexendo sem parar, de forma contínua, de preferência com uma espátula de silicone ou um fouet. Aguarde esfriar e enrole os docinhos no tamanho de sua preferência, passando-os em confeitos coloridos ou açúcar de confeiteiro. Coloque-os nas forminhas e guarde-os em embalagem tampada até a hora de montar a mesa, para que não ressequem.

Boa festa!